Por José Sarney
Não sou daqueles fanáticos pelo esporte; e talvez seja um dos poucos brasileiros que não acompanham os campeonatos esportivos com vontade de esganar os torcedores dos times contrários. Um pouco dessa minha posição deve-se ao meu avesso à violência. Desde os meus tempos de calças curtas, no cinema, na televisão ou em brigas de colégios, fecho os olhos para não ver ninguém apanhar.
Mesmo o futebol sempre digo que é um jogo muito violento. Quando as pessoas me retrucam que é um jogo bonito e elegante, eu contesto que há momentos que não recomendam essa observação. Os chamados carrinhos muitas vezes são horrorosos, e há, na lembrança de todos nós, alguns resultados — para não citar muitos, basta lembrar o joelho aberto do Ronaldo e a cabeçada do Zidane num jogador, cujo nome já tenho a liberdade, nos meus cinquenta mais trinta e oito anos, de não recordar.
Esta minha aversão à violência é tão forte que agora, por exemplo, vendo as campanhas televisivas da última eleição e das atuais, vêm-me à cabeça lutas de boxe, esporte a que nunca assisti — acho que quem a ele assiste tem o mesmo prazer acre que tinham os espectadores dos circos romanos quando as feras devoravam os fiéis cristãos.
Será que a democracia necessita desse ringue em que se transforma uma eleição, quase sempre esquecendo ideias, propostas e metas para desfechar verdadeiros socos, que, por serem verbais, não são inferiores aos físicos?
Também compreendo que seria viver no mundo dos anjos pedir que os políticos utilizassem nas campanhas, em vez de luvas de boxe, leques de plumas abanando o calor da face dos adversários.
Da competição democrática também posso dizer o mesmo que digo do futebol: é um jogo violento, porque é cruel e não tem medidas. Várias vezes tenho citado a frase de Lenin de que devíamos aplicar à política a arte da guerra — aliás, título de um livro de Clausewitz —, isto é, como na guerra, não se deve, na política, ter adversários, mas inimigos, com o único objetivo de extingui-los, quase levantar uma nova guilhotina, como em 1792, na Praça da Concórdia. Ele também defendia que a política devia adotar como método o Terror, também como na Revolução Francesa.
Basta lembrar que, vitorioso na Revolução Russa de 1917, ao receber um telegrama do comandante das tropas de São Petersburgo dizendo que as prostitutas estavam rondando os quartéis e perturbando a ordem dos soldados, que não obedeciam mais à disciplina para correr atrás daquelas belas eslavas que ali faziam ponto, respondeu com um telegrama que ficou célebre: “Fuzilem todas!”
Vamos esquecer todas essas coisas, que fazem parte da história cruel da humanidade, e pensar em eleições dirigidas pelo Barão de Coubertin, o criador das Olimpíadas modernas, em que o importante é competir.
Enquanto elas não vêm, melhor chupar o dedo e fechar os olhos, com o boxe eleitoral dos atuais programas de televisão.