Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, mandou uma resposta direta ao presidente Jair Bolsonaro, que insistiu em minimizar o coronavírus e chegou a classificá-lo como uma “gripezinha” ou “histeria”. Questionado pela coluna sobre qual mensagem ele passaria para o presidente brasileiro, o africano que lidera a agência de Saúde foi claro em contestar sua posição e desautorizar Bolsonaro.
“Em muitos países, as UTIs estão lotadas e essa é uma doença muito séria”, declarou Tedros. O tom usado pelo presidente Jair Bolsonaro em sua mensagem ao país na noite de terça-feira sobre o coronavírus deixou entidades internacionais perplexas e preocupadas com o destino de milhares de pessoas.
Em sua fala, Bolsonaro questionou alguns dos pilares martelados desde janeiro pela OMS para tentar frear a pandemia. Ele colocou em xeque o distanciamento social e o fechamento de escolas. Mas, acima de tudo, deu a impressão de que a doença apenas atinge os mais velhos, algo que a OMS tem alertado que não é o caso.
Instantes antes da resposta de Tedros nesta quarta-feira, o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, fez um apelo para que governos em todo o mundo entendam que a ameaça é para “toda a humanidade”.
Há poucas semanas, Tedros chegou a dizer que vender tal percepção de que se trata de um doença que mata apenas idosos – mesmo que fosse verdade – representa a “falência moral” da sociedade.
Numa outra coletiva, o africano foi enfático: “jovens: vocês não são invencíveis”. Nesta quarta-feira, coube a uma das diretoras técnicas da OMS, Maria van Kerkhove, reforçar a ideia de que crianças também são “vulneráveis” e que casos sérios foram registrados entre jovens.
Para fontes nos organismos internacionais, o discurso de Bolsonaro é “perigoso”, já que incita os mais jovens a desrespeitar medidas de distanciamento social e cuidados básicos. Mas é o tom de Bolsonaro minimizando a doença – a chamando de histeria e “gripezinha” – que gerou enorme preocupação entre os técnicos internacionais nesta quarta-feira.
Consultados pela coluna, vários deles indicaram que o temor é de que, ao mandar essa mensagem, Bolsonaro mina a tentativa da OMS de conscientizar milhões de pessoas sobre a necessidade de tratar a doença como algo sério. Por semanas, a direção da agência vem tentando convencer políticos pelo mundo de que a situação é grave. “Acordem”, chegou a dizer o chefe de operações da entidade, Michael Ryan, aos governos.
Modelos
Além de repetir em grande parte o posicionamento do governo dos EUA, a estratégia de Bolsonaro só encontrou eco nos primeiros dias da crise no Reino Unido. Boris Johnson, o primeiro-ministro, tentou adotar uma estratégia de ação pontual. Mas, pressionado pelos números de mortes e criticado pela atitude, acabou desistindo do caminho adotado e ordenou uma quarentena em todo o país.
O Japão foi citado pelo governo brasileiro como um país que não adotou o distanciamento social. Mas o país ampliou de forma considerável sua capacidade do sistema de saúde e promoveu uma estratégia para testar de forma ampla todos aqueles com algum sintoma.
Também pesou na resposta de Tóquio o hábito de parte de sua população de levar máscaras, além de um compromisso político do governo em mostrar ao mundo que estava pronto para receber os Jogos Olímpicos, o que acabou cancelado.
Outros exemplos de países onde a quarentena não foi adotada dificilmente poderiam ser comparados ao caso do Brasil. No caso da Coreia do Sul, apresentado como exemplo de sucesso, o governo optou por uma campanha em massa para testar os cidadãos. Aqueles com a doença foram isolados e tratados.
Além disso, todos os contatos da pessoa foram rastreados. Outro exemplo frequentemente citado é o do Cingapura. Mas, neste caso, o que facilita o controle e a identificação de cada uma das pessoas atingidas.
Por Jamil Chade