Explicação foi uma espécie de confissão espontânea do suposto crime praticado pelo chefe do executivo
SÃO LUÍS (MA): A Procuradoria Geral do Município (PGM), órgão responsável pela defesa dos interesses da Prefeitura de São Luís em juízo e fora dele, apresentou a contestação da Ação Popular de nº 0812198-19.8.10.0001, movida pelos advogados Pedro Michel da Silva Serejo e Daniele Letícia Mendes Pereira, contra a aprovação do Projeto de Lei nº 55/2019, que resultou na edição da Lei nº 6.454, de 13 de março de 2019. Aprovada e sancionada em tempo recorde, a legislação dispõe sobre o reconhecimento de dívidas consolidadas referentes às despesas de exercícios anteriores.
Diferente da Câmara Municipal, que em apenas cinco laudas, resolveu contestar os argumentos dos autores da ação destacando que agiu amparada no que assevera os artigos do Regimento Interno e da Lei Orgânica do Município, mas omitindo informações para induzir juiz a erro, a Prefeitura de São Luís resolveu abusar da escrita. Para ratificar que o Executivo Municipal cumpriu os ditames legais, rechaçando por completo os argumentos fáticos da AP, mais de 100 laudas foram apresentadas pela Procuradoria do Município.
Dentre os vários argumentos apresentados, uma espécie de explicação/confissão chamou atenção do titular deste blog. Em um dos trechos da extensa peça contestatória, o procurador Airton José Tajra Fonseca diz, pasmem senhores: “E como fica se a lei autorizativa é de 2019 e o parcelamento é de 2015? A explicação: aplica-se o efeito retroativo dessa lei à data do parcelamento, sob pena de que se assim a lei não prever, ficar descoberto de legalidade todo o período entre a data do parcelamento (2015) até a data da publicação da lei, porque normalmente, se não previsto nada no texto da lei, a regra é que a mesma se aplica para o futuro, a partir de sua publicação. Desta forma, a lei autorizativa do parcelamento foi necessária devido a exigência da Secretaria do Tesouro Nacional a partir de 2017 e o efeito retroativo da lei foi legal e também necessário porque esse parcelamento foi firmado entre as partes em 2015”.
Trocando em miúdos a informação acima mencionada, na própria defesa apresentada pela Procuradoria, o Município assume a ilegalidade e, ainda, explica o porquê da retroatividade do art. 4º do PL 55/2019, que resultou na edição da Lei nº 6.454, de 13 de março de 2019. Durante vários momentos, a defesa se refere a um parcelamento, entretanto, omite que antes de efetivar o parcelamento o ente público precisa reconhecer a dívida, e segundo o ordenamento jurídico vigente, o RECONHECIMENTO DE DÍVIDA se equipara a uma operação de crédito, sendo necessário para tanto, uma autorização legislativa expressa.
Outro fato que chamou atenção na defesa apresentada, diz respeito a contradição da própria PGM. Ratificando, a defesa evidencia as razões da retroatividade, admitindo, assim, que caso não retroagisse, “ficaria descoberto de legalidade todo o período entre a data do parcelamento (2015) até a data da publicação da lei”, mas, em outros momentos, admite que o Município fez prever nas leis orçamentárias de 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019 a dívida (referente ao parcelamento) e solicitou a autorização para pagá-la, o que recebera corretamente do Poder Legislativo, como requer as normas de direito financeiro.
“A lei orçamentária é a previsão de receita e a fixação de despesas que o ente público terá em determinado exercício financeiro. Para tanto, requer a autorização do Poder Legislativo para usar das receitas públicas para pagar as despesas públicas nele previstas. Desta forma, resta clara a legalidade do reconhecimento de dívida do Município de São Luís para com a empresa SLEA – São Luís Engenharia Ambiental S/A, uma vez que existe contrato vigente (contrato de parceria público privada (PPP) de nº 046/2012) e a empresa efetivamente prestou e vem prestando o serviço considerado de natureza essencial, devendo receber o convencionado nesse contrato, não se podendo dar ensejo a sua eventual paralisação ou precarização em respeito ao princípio da continuidade dos serviços públicos”.
Poderíamos citar, ainda, várias outras teses arguidas pela defesa para enfrentar a demanda, mas por respeito aos nossos leitores vamos citar apenas mais uma: “Em 2015, quando firmado o Termo de Reconhecimento de Dívida que resultou no parcelamento da mesma, não havia a necessidade legal de uma lei municipal específica para autorizar o parcelamento, bastava a sua previsão nas leis orçamentárias, o que foi feito pelo Município. Assim, não há de se falar em “pedaladas fiscais” ou qualquer outra omissão ou descumprimento por parte da municipalidade porque não havia necessidade da lei específica para o parcelamento de uma dívida municipal advinda de prestações continuadas ensejadas por contrato administrativo de parceria público privada efetivado deste o ano de 2012”. Acredito que um único detalhe passou despercebido pelo douto procurador, digo, para parcelar, de fato, não se faz necessário autorização, entretanto, para reconhecer uma dívida, o que se equipara a uma operação de crédito, sim.
Diante de tantas informações pergunta-se: quais das teses deverão ser levadas em consideração pelo magistrado:
1 – que o Município fez prever nas leis orçamentárias de 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019 a dívida (referente ao parcelamento) e solicitou a autorização para pagá-la, o que recebera corretamente do Poder Legislativo, como requer as normas de direito financeiro, quando aprovado a LDO ou;
2 – se assim a lei não prever, ficará descoberto de legalidade todo o período entre a data do parcelamento (2015) até a data da publicação da lei, porque normalmente, se não previsto nada no texto da lei, a regra é que a mesma se aplica para o futuro, a partir de sua publicação.
Qual das duas teses será acatada pelo juiz Douglas de Melo Martins?